Peritos da Polícia Federal em Campo Grande (MS) desenvolveram e aprimoraram um programa capaz de identificar, em poucos minutos, imagens e vídeos de pornografia infanto juvenil arquivados com suspeitos de pedofilia.
A ferramenta forense NuDetective auxilia operações com a busca de arquivos de pornografia com imagens de crianças e pré-adolescentes, ainda no local do crime, durante o mandado de busca e apreensão.
“O suspeito não precisa compartilhar as imagens para responder criminalmente. Basta ter fotografias e filmes que exponham crianças para ser responsabilizado”, explica o engenheiro Pedro Monteiro da Silva Eleutério, 40, que desenvolveu o programa em parceria com o cientista da computação Mateus de Castro Polastro, 37.
Esta é a principal diferença da ferramenta NuDetective em relação aos outros programas. Ela detecta e identifica arquivos que são desconhecidos e que nunca foram compartilhados na internet. O nome junta dois termos em inglês: “nude” (nu) e “detective” (detetive).
Os peritos já identificaram vídeos e fotos de abuso até de bebês com menos de um ano de idade. Em um computador de uma pessoa que se interessa por esse tipo de conteúdo, geralmente existem fotografias e vídeos de crianças de ambos os sexos e idades antes da puberdade.
Não existem estudos que definam um padrão sobre o pedófilo. No geral, de acordo com a Polícia Federal, essa pessoa possui muitos arquivos ilícitos, podendo variar de cem a 5.000 imagens de crianças.
Já foram flagrados em operações desde pedófilos jovens, com 18 anos, até pessoas com mais de 60 anos.
De acordo com os peritos da Polícia Federal, existe uma tendência de se acreditar que as meninas são as mais procuradas pelos pedófilos, mas isso não é verdade. Os arquivos de pornografia infantojuvenil incluem meninos na mesma proporção.
A ideia do NuDetective surgiu devido à mudança do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 2008, que tipificou como crime a posse de arquivos de pornografia infantojuvenil.
“Ele vasculha o dispositivo de armazenamento computacional e identifica os arquivos mais prováveis de conterem pornografia infantojuvenil, através da utilização de quatro técnicas [análise de imagens, análise de vídeos, análise de hash e análise de nomes, leia mais abaixo], que são utilizadas conjuntamente, de forma combinada. Cabe ao perito visualizar os arquivos trazidos pela ferramenta e definir se é pornografia”, afirma Eleutério.
O programa vasculha dispositivos de armazenamento computacional em HDs, computadores, cartões de memória, pendrives, notebooks, celulares e tablets.
“Em geral, 15 minutos são suficientes para identificar se um dispositivo possui arquivos relacionados à pornografia infantojuvenil e esse tempo já inclui a análise do conteúdo. Isso é possível, pois o perito não precisa aguardar o programa terminar a varredura para analisar os resultados. Enquanto roda, o programa já exibe os arquivos suspeitos encontrados em tempo real.”
Antes, os peritos podiam levar até 20 dias para contabilizar, na Polícia Federal, todas as imagens armazenadas em um dispositivo. No laboratório, os peritos apuram, inclusive, se o pedófilo está se comunicando com a criança ou compartilhando as imagens com outras pessoas.
Como funciona
A análise de imagens, que foi a ideia original para concepção da NuDetective, atua como um detector de nudez.
Inicialmente, o software realiza a detecção automática de nudez em imagens por meio de técnicas de identificação de pixels de pele e de geometria computacional.
Depois, o NuDetective verifica o nome dos arquivos a fim de detectar as expressões mais comuns de pedofilia.
Em seguida, o programa compara o valor hash [a impressão digital do arquivo] com uma lista de valores de arquivos ilegais conhecidos.
Por fim, o programa calcula a amostra ideal e extrai frames de vídeos, realizando a detecção de nudez nos frames a partir dos algoritmos utilizados pela análise de imagem, permitindo a identificação de vídeos de pornografia infantojuvenil.
A taxa de sucesso do programa é de 95% de detecção de fotografias e 85% para vídeos com imagens de pedofilia.
“Crianças não devem possuir redes sociais convencionais”
Segundo os peritos, a melhor forma para evitar abusos na internet é a prevenção. Eles aconselham aos pais a ficarem atentos a todo o conteúdo que as crianças acessam e, principalmente, com quem conversam no mundo virtual.
“Antigamente a gente ouvia dizer que o computador tinha que ficar na sala. Mas hoje as crianças têm smartphones e tablets. E elas ficam 100% do tempo conectadas, sozinhas no quarto. Aí mora um perigo muito grande. Crianças não devem possuir redes sociais convencionais –existem redes sociais específicas para elas. A política de segurança e uso do Facebook, por exemplo, proíbe menores de 13 anos de possuírem um perfil– só que ninguém lê esse tipo de coisa”, explica Eleutério.
Tecnologia foi desenvolvida pelos próprios peritos
Os peritos da Polícia Federal desenvolveram o programa fora do horário de trabalho, no final de 2009. Hoje está na versão 3.2. “Toda a metodologia foi pesquisada e desenvolvida por nós mesmos. Lemos diversos artigos científicos relacionados e a partir de testes e experimentos desenvolvemos as melhores técnicas que entendemos que iriam funcionar bem”, explica Eleutério.
O NuDetective é gratuito, mas exclusivo de forças da lei e de instituições públicas. Já solicitaram e receberam o programa mais de 50 instituições nacionais, como a Polícia Federal, institutos de criminalística estaduais, polícias civis estaduais, Exército, Marinha, Ministérios Públicos estaduais e federais, além de universidades públicas. Fora do Brasil, a NuDetective foi enviada a nove países, incluindo Portugal, Argentina e EUA.
Os peritos já receberam prêmios por publicações, um dos quais no Encontro Mundial de Peritos, que aconteceu na Coreia do Sul, em 2014. O prêmio mais relevante, segundo eles, foi o Destaque Forense, concedido pela Sociedade Brasileira de Ciências Forenses, que escolheu uma das publicações da dupla como o melhor artigo científico nacional em ciências forenses no biênio 12-13.
Embora não tenham estimativas oficiais, os peritos avaliam que mais de 300 pedófilos já foram identificados com o auxílio da NuDetective no Brasil.
As denúncias sobre pedofilia podem ser feitas nas delegacias de Polícia Civil da cidade ou por telefone, no Disque 100. Pela internet, é possível denunciar pelo aplicativo Proteja Brasil.
Fonte: UOL