Localizada na Serra dos Pombos, em Anagé, a cerca de 580 km de Salvador, a famosa “Caçamba de Anagé” há décadas desperta a curiosidade de moradores e visitantes. O que à primeira vista parece apenas um veículo abandonado no alto de um morro, guarda uma história cheia de lendas, resistência e identidade cultural.
A caçamba, um modelo Mercedes-Benz 1113, foi levada até o topo da serra no final da década de 1980 por um grupo de trabalhadores rurais. O objetivo, segundo relatos de antigos moradores, era utilizá-la como abrigo improvisado durante o corte de madeira e a extração de pedras. Porém, com o tempo, o motor pifou, o acesso ficou difícil e o veículo foi deixado ali, como um marco involuntário do tempo.
Desde então, diversas histórias passaram a circular sobre a caçamba. Alguns dizem que ela foi usada por contrabandistas durante a seca dos anos 90. Outros afirmam que ali aconteceu um milagre: um vaqueiro perdido encontrou refúgio nela durante uma tempestade e jurava ter sido salvo por uma “luz divina” que surgiu do interior da cabine.
A fama da caçamba cresceu tanto que virou ponto turístico alternativo. Jovens sobem a Serra dos Pombos para tirar fotos com o veículo enferrujado, muitos levando suas próprias versões do “mito da caçamba”. Para alguns, ela é símbolo de resistência. Para outros, é apenas um ícone pop rural, um tipo de “Stonehenge do Sertão”.
Na época em que a caçamba foi levada para a serra, Anagé era administrada pelo então prefeito José Nilton Matos, conhecido por incentivar pequenos projetos rurais e dar apoio logístico às comunidades mais afastadas. Já o Governador da Bahia era Waldir Pires, que governou o estado entre 1987 e 1989. Ambos, segundo moradores antigos, tinham conhecimento das atividades nas regiões serranas, mas viam a presença da caçamba como algo inofensivo e até curioso.
Recentemente, houve discussões sobre a remoção do veículo, por motivos ambientais e de segurança. No entanto, a comunidade local se mobilizou, reivindicando o direito de manter a caçamba como parte da identidade cultural de Anagé. “É mais que um ferro velho, é nossa história. Quem vive aqui sabe o valor simbólico disso”, diz dona Celina, moradora há mais de 40 anos.
A prefeitura estuda agora a criação de um pequeno mirante com estrutura básica de visitação, valorizando o turismo de base comunitária. A ideia é que a caçamba continue ali, não como sucata, mas como símbolo da força sertaneja, da criatividade e da forma como as pessoas transformam o ordinário em algo extraordinário.