O MOTIM DO SUDOESTE- Relato de Dr. Altamirando Alves Rodrigues

Durante minha direção do Departamento de Polícia do Interior – DEPIN, da Polícia Civil da Bahia, ao entardecer do dia 05 de abril de 1997, sábado, encontrava-me na Delegacia Regional de Polícia de Ilhéus, encerrando termo de interrogatório de concorrente em assalto a banco e latrocínio, quando recebi telefonema do Dr. Francisco Netto, Secretário de Segurança Pública, determinando o meu imediato deslocamento para Vitória da Conquista, a fim de supervisionar o gerenciamento da crise provocada por detentos amotinados no Complexo Penitenciário Nilton Gonçalves.
Embora na nomenclatura das pessoas envolvidas numa operação de crise não conste a figura do Supervisor, entendi qual seria o meu papel.

Chegando ao território, encontrei o Delegado Valdir Gomes Barbosa, designado para coordenar as negociações, a Diretora do Presídio, Dra. Edilza Lins Almeida, a Dra. Promotora de Justiça, Guiomar Miranda de Oliveira e Dr. Arnaldo Agle, Diretor do Sistema Penitenciário da Bahia.

Tomei conhecimento de que, durante culto evangélico, 14 detentos tomaram nove reféns, entre servidores e pastores.

Preparamos o Teatro de Operações e Valdir Gomes Barbosa, Delegado com extensa vivência policial e conhecedor da doutrina e prática sobre situação de crise, incluindo aquela emblemática que administrou, causada pelo sequestrador, Leonardo Pareja e a refém, Fernanda Viana, ocorrida em setembro de 1995 na cidade de Feira de Santana, tendo como cativeiro um dos quartos do Samburá Hotel.
Valdir iniciou a interlocução com o líder do movimento, amotinado Idalmar dos Santos. Na manhã seguinte a equipe foi reforçada com o Grupo Especial Tático, comandado pelo hoje Comandante-Geral da Polícia Militar da Bahia, na ocasião, Capitão PM Paulo José Reis de Azevedo Coitinho e o também Capitão PM, Júlio César.

Entre os dias 05 e 12, sábado a sábado, as negociações não avançaram, em razão dos pedidos inaceitáveis formulados pelos amotinados. Mas de modo eficiente conseguimos conter o agravamento da situação, mantendo a calma entre autores e reféns, e as instalações internas do presídio, preservadas no status quo.

À noite do dia 12, sábado, recebemos comunicação de Dr. Francisco Netto dando conta de que, o governador Paulo Souto estava muito incomodado com a situação e pedia para tentarmos não amanhecer segunda-feira, 14, sem solução.

Nesse lapso temporal, o então prefeito de Vitória da Conquista, Guilherme Menezes, em dias alternados e sempre à tarde e noite, comparecia ao local e se posicionava junto à fita de barricada. Mesmo convidado, não adentrava ao Teatro de Operações, sob a alegação de que ali estava em solidariedade aos reféns e aos seus familiares. E leigo na administração de crise daquela natureza, sua presença no teatro seria absolutamente ineficaz.

Passamos a noite de sábado examinando fotos aéreas, as câmeras que puderam ser instaladas, mapeando os pavilhões e preparando a logística para invasão, como última alternativa. Aliás, em caso extrema necessidade.

Na manhã de domingo, Cleide Germano, a esposa do líder do movimento nos procurou, pedindo para conversarmos com seu esposo, Idalmar dos Santos. Iniciamos a interlocução e enquanto ouvíamos os seus últimos pedidos, relacionados às transferências dos que tinham distrito da culpa em comarcas de: Fortaleza/Ceará e Praia Grande/Baixada Santista/São Paulo e outros Municípios do Estado da Bahia, arguimos as formalidades imperiosas, incluindo decisões judiciais e burocracia na liberação de recursos para a escolta, o que não ocorreria prontamente.

Nesse interim, passando sob a fita de isolamento, surgiu o então deputado federal Jaques Wagner se dispondo a acompanhar o processo de negociações, prometendo aos amotinados, uma vez por mês, durante um ano, um representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos deputados iria visitar os presídios para onde os detentos fossem transferidos e acompanhar a tramitação do processo ou processos de cada um.

Os amotinados decidiram pela rendição e liberação dos reféns sem uso da força. O encerramento da situação da crise, sem vítima de lesão física, violação de preceito legal, aceitação do resultado pela sociedade e promessa de assistência psicológica aos reféns, compensou os custos financeiros e o desgaste físico e mental deles e nossos, protagonistas da operação.
Mais tarde recebemos telefonema do Dr. Francisco Netto, dando conta de que, o deputado Luiz Eduardo Magalhães pediu carona para o seu colega e amigo Jaques Wagner, na aeronave que nos conduziria para Salvador, pedido chancelado pelo Governador Paulo Souto. Efetivamente, ele viajou conosco e nos dias seguintes pedia notícias sobre a remoção dos amotinados.
Na manhã do dia 15, terça-feira, o governador Paulo Souto nos convidou para agradecer pessoalmente pelo nosso desempenho no episódio.

Tempo depois, em encontro que tivemos em Abaíra, pilheriei com o então Governador Jaques Wagner, dizendo-lhe que a sua estrela não brilhava somente no seu partido, PT. Brilhou também naquele episódio. Ele sorriu e gabola passou a narrar a ocorrência para outros agentes políticos presentes no evento.

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