BANQUETE DE MENDIGOS

Nos idos de 1955, minhas irmãs Miltamira e Jailta estudavam no Instituto Ponte Nova, educandário no Município Wagner, fundado por missionários estadunidenses que exercia influência na educação e no modo de vida da sociedade em volta, uma vez que, a escola atendia mais de 30 municípios.
Incluía no conteúdo curricular, arte e teatro.
Nas férias elas elaboravam a apresentação de Peças com a participação de jovens da terra. Numa delas, intitula Bárbara Heliodora, textualizaram para o palco a Inconfidência Mineira.
Intitularam de Bárbara Heliodora, em homenagem à influência dela no movimento inconfidente, principalmente na preparação dos discursos de seu marido, o poeta Alvarenga Peixoto e lhe dirigindo a emblemática frase: “Trair Jamais”. Por isso foi a primeira mulher brasileira a participar ativamente de movimento político.
A interpretação dos jovens atores na apresentação da história foi tão bem-sucedida, que houve várias reprises, sempre com lotação completa e plateia renovada, consequência do comentário boca a boca, único meio de comunicação.
Em mim, com 9 anos, despertou a admiração e consequentemente o interesse pela arte teatral.
Em 1962, o texto teatral de Dias Gomes, O Pagador de Promessas, inspirou a adaptação cinematográfica e em 06 de agosto de 1962 o filme foi lançado e graças às insólitas interpretações de
Leonardo Vilar – Zé do Burro,
Glória Menezes -Rosa,
Dionísio Azevedo – Padre Olavo,
Geraldo Del Rey – Bonitão,
Roberto Freire – Dedé Cospe-Rima,
Norma Bengel – Marli,
Othon Bastos – Repórter e
Antônio Pitanga – Mestre Coca, teve retorno de bilheteria que surpreendeu até o seu roteirista e diretor, Anselmo Duarte, bem como, o credenciou a ser premiado com a Palma de Ouro no festival de Cannes, na categoria de melhor filme, conquistou outros inúmeros prêmios, incluindo como o melhor da América do Sul, e indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro na edição de 1963, sendo vencido pelo filme francês – Les Dimanches de Ville d’Avray (Sempre Aos Domingos).
Em Livramento, sob a coordenação do advogado Luiz Freire, professor de português do Curso Científico e gerente do Banco de Desenvolvimento do Estado da Bahia, docentes e discentes
do Colégio João Villas-Bôas (grafia recomendada pelo meu amigo de fé, meu irmão camarada, Raul Villas-Bôas Teixeira) e mais cidadãos da comunidade, formaram um grupo com pendores artísticos e com base no filme e diante da presença do sincretismo religioso na obra, depois de receberem amém do bom pastor, o saudoso Padre Sinval Laurentino de Medeiros, encenaram, no Salão de Festas da Associação dos Amigos de Livramento, a Peça O Pagador de Promessas. Salienta-se que, superando o amadorismo com motivação e habilidade adquiridas com alguns ensaios, o grupo, no final de cada ato era aplaudido de pé e no final, ovacionado.
Recorrendo aos nossos hipocampos, eu e Lita de seu Joaquim de Melania lembramos do seguinte elenco e o papel de cada um:
Luiz Freire, professor de português do Curso Científico e gerente do Banco de Desenvolvimento do Estado da Bahia, o hoje Bradesco, no papel de Zé do Burro,
Joelita Duque, discente do Curso Pedagógico, no papel de Rosa.
Zeferino Santos Pereira – Padre Olavo
Professora Rita de Cássia – Beata
Artur Matias – Dedé Cospe-Rima
Sebastião de Castro Meira – Vendeiro
Manoel Caires Mendes – Policial
Genebaldo Villas Boas – Repórter
Almir Pina – Policial
O sucesso da apresentação dispensa comentário e ampliou a minha admiração e interesse pela arte teatral.
Morando em Salvador a partir de 1965, por algumas razões, incluindo falta de oportunidade, não cultivei minha apreciação, nem mesmo assistindo a alguma peça. Contudo, no ano de 1970, a convite do protagonista da Peça Banquete de Mendigos, Mário Gusmão, a assisti em uma das apresentações no Teatro Vila Velha. O talento do ator Mário Gusmão é o que se pode chamar “um ponto fora da curva do sino”.
Em sendo o conteúdo da peça do autor João Augusto, protesto contra o regime militar, certamente com a anuência dele, em 10 de dezembro do ano de 1973, Jards Macalé e Chico Chaves em comemoração dos 25 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, apresentaram no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro o Show com o título Banquete dos Mendigos. Portanto, mudando apenas o “de” Mendigos para “dos” Mendigos.
Em 02 de outubro de 1994, o ator Moacir Moreno da Cia Baiana de Patifaria, foi vítima de latrocínio praticado por Paulo Sérgio Carvalho Moreira, cognominado Paulo Bomba e Paulo Moreira Argolo, cognominado Paulo de Elói.
Preso Paulo Bomba, o apresentador do Programa Linha Direta, Marcelo Rezende veio a Salvador entrevistá-lo e compareceu no meu local de trabalho acompanhado de Lelo Filho também ator da Cia Baiana de Patifaria. Naquela oportunidade Lelo me convidou para assistir a peça A Bofetada, em cartaz no Teatro Sesi Rio Vermelho.
Há 4 anos, mais ou menos, encontrei os integrantes da Cia Baiana de Patifaria, na Pousada da Conquista, oportunidade em que Lelo me apresentou aos novos atores e de pronto disse: “o Dr. Ainda não aceitou o meu convite para assistir nossa apresentação”. Como diz no popular, só me restou a cara de paisagem.
Hoje, aos 75 anos e com a debilidade natural limitando o meu ir e vir, provavelmente não terei mais oportunidade de assistir e apreciar espetáculo que novos talentos brotados desse campo fertilíssimo que é o nosso gigante Brasil, oferecerá aos admiradores da arte teatral.

Escrita por Altamirando Rodrigues

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