O debate sobre o impacto negativo do uso de agrotóxicos para a saúde humana foi aquecido nas últimas semanas, desde que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou, no final de julho, um novo marco regulatório para avaliação dos riscos vinculados a esses produtos.
A nutricionista e professora da FTC Thais Vieira Viana considera os agrotóxicos “uma afronta à saúde pública”, uma vez que eles tornam nocivos aqueles alimentos que normalmente seriam a base para uma vida saudável: as frutas, verduras, legumes e hortaliças. “A questão é justamente essa, são os principais alimentos que a gente indica, enquanto profissional da saúde, pra reduzir outras doenças”, argumentou Thais ao citar a obesidade, diabetes e hipertensão como exemplos.
A profissional destaca ainda que pesquisas científicas já constataram que o consumo destas substâncias a longo prazo potencializam as chances das pessoas terem cânceres e distúrbios neurológicos. O Instituto do Câncer (Inca) acentua que regiões com alto uso de agrotóxicos apresentam incidência de câncer bem acima da média nacional e mundial. Quanto ao consumo a curto prazo, a especialista afirmou que até o momento não existem estudos e pesquisas que indiquem riscos de intoxicação.
Em discordância da afirmação da ministra da Agricultura Tereza Cristina, de que “nenhum consumidor brasileiro está sendo intoxicado”, a nutricionista defende atenção e consciência das pessoas na hora de escolher o que levam para a mesa para se alimentar. A saída, de acordo com Thais Vieira, seriam as pessoas optarem pelos produtos in natura produzidos por agricultores familiares e vendidos em feiras de bairro. “O ideal é escolher essas feiras com produtos que têm um cultivo mais manual, principalmente aquelas em que são comercializados alimentos que vêm da agricultura familiar, que têm um cultivo mais natural, não produzem em larga escala, então não usam tantos defensivos”, explicou a nutricionista.
Quase duas mil pessoas já morreram por intoxicação com agrotóxicos no Brasil, desde 2007 conforme dados aputados pelo Gloro Rural junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Mais de 40 mil casos de intoxicação já foram registrados em um levantamento realizado entre 2007 a 2017. O Paraná, segundo maior produtor de grãos do país, é o estado com maior número de casos registrados e o que tem o sistema mais eficiente de notificação. As comunidades paranaenses se organizam para tentar se livrar dos efeitos dos venenos agrícolas. Em alguns casos, ele chega pelo ar.
Feiras de produtos orgânicos, segundo a professora, acabam não sendo uma opção para a maioria das pessoas, uma vez que são mais difíceis de ser encontradas e nem sempre têm preços são acessíveis a toda a população.
Atualmente, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Os produtos são utilizados na agricultura para eliminar insetos ou ervas daninhas nas plantações e também são chamados de defensivos agrícolas ou agroquímicos. Com a mudança de critérios, a Anvisa passou a usar estudos de mortalidade para definir a classificação dos agrotóxicos, ou seja, agora a agência categoriza esses produtos a partir do risco de morte por contato. Em entrevista coletiva nesta semana, o diretor da Anvisa Renato Porto disse que o objetivo da nova norma é deixar na classificação de extrema toxicidade apenas aqueles produtos que trazem risco de letalidade para o produtor, removendo dessa classificação os itens que podem ter consequências menos graves, como corrosão na pele e opacidade da córnea. As novas regras reduziram o número de produtos considerados “extremamente tóxicos” à saúde ao retirar a tarja vermelha de 600 agrotóxicos e redistribui-los entre outras categorias.
Além disso, o número de classes em que um produto pode ser enquadrado passou de quatro para seis, de acordo com Renato Porto, que ainda argumentou que a partir dessa novidade o agricultor passará contar com um número maior e também mais preciso de informações nos rótulos para que possa avaliar qual substância utilizar.