Os jovens de hoje passam uma quantidade impressionante de tempo diante de telas – adolescentes entre 11 e 15 anos, por exemplo, entre seis e oito horas por dia, isso sem incluir o tempo gasto em frente ao computador para fazer as tarefas de casa. Aliás, até mesmo o adulto médio no Reino Unido passa mais tempo olhando para uma tela do que dormindo, indicam as pesquisas.
Começa cedo. Um terço das crianças britânicas tem acesso a um tablet antes de chegar aos 4 anos de idade. Não é uma surpresa, então, que as gerações mais jovens de hoje serão expostas (e sem dúvida irão participar) das redes sociais que os mais velhos usam. O Snapchat, por exemplo, é extremamente popular entre adolescentes. Uma pesquisa de dezembro de 2017 apontou que 70% dos jovens americanos com idades entre 13 e 18 anos usam a rede. A maioria dos entrevistados também tem uma conta no Instagram.
Os números do Reino Unido e do Brasil vão na mesma direção.
Mais de três bilhões de pessoas estão registradas em uma rede social e muitos usam mais de uma. Os adultos americanos passam, em média, de 2 a 3 horas por dia nelas. Já o brasileiro gasta diariamente 9 horas e 14 minutos navegando na internet – somos a terceira população no mundo que mais passa tempo na rede, segundo pesquisa da empresa Hootsuite.
A tendência tem mostrado desdobramentos preocupantes, e cientistas se dedicam cada vez mais a pesquisar o impacto do uso das redes sociais na saúde, especialmente no sono.
Os resultados até agora não são animadores. Temos que encarar o fato de que as redes sociais têm um efeito claramente negativo sobre nosso sono e, com isso, sobre nossa saúde mental.
Desde o crescimento meteórico das redes sociais, Brian Primack, diretor do Centro de Pesquisa em Mídia, Tecnologia e Saúde da Universidade de Pittsburgh, tem estudado seu impacto na sociedade. Junto com Kessica Levenson, ele examina as relações entre tecnologia e saúde mental, observando o lado bom e o ruim.
Ao pesquisarem a possível ligação entre redes sociais e depressão, eles esperavam um efeito duplo – que as redes sociais pudessem às vezes aliviar a depressão e às vezes exacerbá-la, um resultado que pode criar uma curva em formato de “u” em um gráfico. No entanto, uma pesquisa com quase 2 mil pessoas revelou algo muito mais surpreendente.
Não houve curva alguma, a linha era reta e em uma direção indesejável. Em outras palavras, um aumento do uso de redes sociais está associado a um aumento da possibilidade de sofrer de depressão, ansiedade e um sentimento de isolamento social.
“De uma maneira objetiva, você pode dizer: esta pessoa está interagindo com amigos, enviando sorrisos e emojis, você pode dizer que essa pessoa tem muito capital social, que está muito engajada. Mas nós descobrimos que essas pessoas parecem ter mais sentimentos de isolamento social”, diz Primack.
O que ainda não está claro, porém, é a direção causal exata: a depressão aumenta o uso de redes sociais ou o uso das redes sociais aumenta a depressão? Primack sugere que ambas as direções podem estar corretas, o que é ainda mais problemático, “já que há um potencial de ciclo vicioso”. Quanto mais depressiva uma pessoa é, mais redes sociais ela pode usar, o que prejudica sua saúde mental mais ainda.
Mas há outro impacto preocupante. Em um estudo de setembro de 2017 com mais de 1,7 mil jovens adultos, Primack e seus colegas descobriram que, em termos de interação nas redes sociais, o horário do dia tem um papel fundamental. O engajamento durante os últimos 30 minutos do dia era o mais forte indicador de uma noite de sono ruim. “Era completamente independente do tempo total de uso durante o dia”, diz Primack.
Há vários fatores que poderiam explicar isso. Um cuidado que hoje é muito popular diz respeito à luz azul emitida pelas nossas telas, o que inibe nossos níveis de melatonina – uma substância química que efetivamente nos diz que é hora de dormir.
Também pode ser possível que o uso das redes sociais aumente a ansiedade de uma pessoa conforme passa o dia, o que torna o desligamento no final do dia mais difícil. “Então os pensamentos e sentimentos voltam para nos assombrar quando tentamos dormir”, diz Primack. Ou uma razão mais óbvia pode ser que as redes sociais sejam muito tentadoras e simplesmente reduzam nosso tempo de sono.
Sabemos que atividades físicas ajudam as pessoas a dormirem melhor. Mais tempo de tela também pode reduzir o tempo gasto em atividades, uma ligação que foi comprovada por pesquisas.
“Ela induz um comportamento mais sedentário durante o dia. Se você tem um smartphone na mão, você não estará mexendo seus braços e pernas tão rapidamente. Se você considerar essa redução em seis meses, você pode ter uma nova geração que não se mexe muito durante o dia”, diz Aric Sigman, um professor de saúde educacional para crianças.
Se o uso de redes sociais está aumentando a ansiedade e a depressão, pode ser que isso impacte o sono. Se você se deita na cama se comparando aos posts de outras pessoas com fotos de férias e hashtags de #gratidão e #minhavidaperfeita, você pode achar que a sua vida está ruim, o que pode fazer você se sentir pior e continuar acordado.
E então parece ser um caso de questões inter-relacionadas que se repetem na prática. As redes sociais estão ligadas com mais depressão, ansiedade e falta de sono. E uma falta de sono pode prejudicar a saúde mental e ser o resultado de problemas de saúde mental.
A falta de sono tem outros efeitos secundários: está ligado e um risco maior de doenças cardíacas, diabetes, obesidade, performance acadêmica ruim, reação mais lenta ao dirigir, comportamento arriscado.
O pior é que, em termos de privação do sono, geralmente são os jovens o grupo mais afetado. Isso porque a adolescência é uma época de mudanças biológicas e sociais importantes que são críticas para o desenvolvimento do indivíduo.
Os adolescentes também levam mais tempo para construir o que foi chamado de “motor do sono” – que é o que o leva a dormir quanto mais tempo você passou acordado, explica Jessica Levenson, do Departamento de Medicina da Universidade de Pittsburgh. Isso contribui para a dificuldade ainda maior dos adolescentes de dormir à noite, diz ela.
Lovenson agora se preocupa com o fato de que o uso de redes sociais e as pesquisas sobre esse hábito estão mudando e crescendo tão rapidamente que é difícil acompanhar.
“É nossa responsabilidade acompanhar os impactos, sejam bons ou ruins”, diz ela. “Nós estamos apenas começando a nos dedicarmos ao impacto do uso das redes sociais. Professores, pais e pediatras precisam perguntar aos adolescentes: com que frequência? Quando? Como vocês se sentem ao usá-las?”
Para combater quaisquer prejuízos das redes sociais, está evidente que a moderação é chave. Sigman diz que devemos usar horários específicos ao longo do dia para nos distanciarmos das nossas telas e fazermos o mesmo com as crianças.
Os pais, diz ele, precisam ter lugares da casa onde os aparelhos podem ou não serem usados “para que não seja uma situação fluida, na qual as redes sociais estejam em todas as partes da sua vida, sem zonas de proteção”. Isso é especialmente importante considerando que as crianças ainda não desenvolveram níveis adequados de controle de impulso para saber quando é o bastante.
Primack concorda. Ele não está dizendo para as pessoas pararem de usar redes sociais, mas para considerarem quanto – e exatamente em que horas do dia – elas façam isso. “A questão é que, quando há tamanho poder tentando nos manter grudados nesses sites, será difícil competirmos com eles”, diz ele. Primack espera que pesquisas fortes na área e conselhos de gerenciamento de uso, especialmente quando se trata de momentos de proibição de uso das redes, possa balancear a batalha.
Quanto aos adultos, se você estava prestes a dormir com seu celular na mão ontem à noite e se sente um pouco cansado hoje, você tem o poder de controlar isso. Você pode dormir melhor se colocar seu celular de lado.
Fonte: BBC